top of page

Dia 19 de janeiro de 2024 fizemos uma roda de conversa de última hora aqui no Mulheres que Conduzem antes da nossa aula regular e da nossa ida em grupo ao baile Forró Não-Mono. Neste dia tínhamos 12 mulheres presentes nesta conversa e abaixo apresentamos um resumo dos pontos e dúvidas trazidas por elas, incentivamos aqui outras pessoas e grupos a se questionarem junto conosco: A quem serve a Monogamia e a Não-monogamia?

 

 

 

A Origem dessa roda de conversa e nossos entendimentos sobre a não monogamia

 

Nossa discussão se iniciou com a indignação de muitas alunas com algumas postagens estilo “Tinder” constando foto, orientação sexual, signo e nível de Forró em um grupo antes da festa. Refletimos sobre a replicação do machismo neste sistema de colocar pessoas em caixinhas e em prateleiras de um app de relacionamentos, sobre pegação e sobre como estes fatores estão presentes em toda a sociedade e não apenas no ambiente não-mono. Refletimos também sobre como eventos como este abrem espaço e curiosidade para conversas similares às nossas, questionando se existe uma forma certa e única de se relacionar.

 

O que é ser Não-mono? Com certeza não é ter um monte de contatinhos para acessar todo dia na agenda do celular, pois esse comportamento já existia antes mesmo da invenção das agendas. Seria um exercício de compreender melhor nossos limites, vontades e liberdades? Em um relacionamento não-monogâmico é comum se relacionar com mais de uma pessoa, entretanto não existem regras pré-definidas neste modelo, mas é necessário (des)construí-las em conjunto, necessitando assim de muita conversa, estabelecendo limites, respeitando um pouco mais a individualidade e a essência de cada pessoa envolvida, o que pode levar a relações com mais liberdades que relações fechadas.

Nesse questionamento algumas mulheres trouxeram a ideia de Não-Monogamia Política, onde nela aconteceriam parcerias mais horizontais e acolhedoras, envolvendo uma deshierarquização da vida, do amor, da comunicação e dos afetos. As relações tradicionais monogâmicas apresentam moldes do que deve ou não ser feito, como, por exemplo, etapas no desenvolvimento de relacionamentos: namorar, noivar, casar, etc; e a não-monogamia passa por repensar e romper essa estrutura. Nesse contexto a deshierarquização seria romper hierarquias de poder e importância entre as nossas relações, seja entre várias pessoas que se relacionam romanticamente ou entre relacionamentos românticos, familiares e amizades. Quais são, afinal, os caminhos para desconstrução da lógica do poder e vivência de relações mais amorosas onde o individual e o todo possam co-existir em interdependência?

 

São inúmeras as formas de se viver a não-monogamia e muitas delas não estão no âmbito das relações sexuais ou afetivas, mas sim numa esfera maior que reflete os jogos de poder do capitalismo e do patriarcado. O feminismo por sua vez rompe ideias - como rivalidade feminina, subserviência, padrões de beleza, autoestima e culpa - e essas disrupções caminham em conjunto com o que entendemos ser essa não-monogamia política. A partir disso nos questionamos: Ser feminista em si já é ser uma não-monogâmica política?

Não encontramos respostas prontas para essas e outras perguntas feitas ao longo da roda de conversa, mas no trecho abaixo retomamos alguns recortes de gênero trazidos pelas mulheres presentes, que podem nos ajudar a pensar esses temas.

 

Mas afinal, a quem serve a monogamia e a não-monogamia?

 

Durante a roda de conversa, muitos foram os recortes de gênero trazidos na discussão e eles podem nos ajudar a pensar se cada um desses modelos de relacionamentos serve a um gênero específico ou não. Abaixo redigimos alguns pontos que foram abordados durante a roda e podem auxiliar nesse questionamento, sendo eles: traição, comunicação, divisão de tarefas e cuidados familiares.

 

A traição em relacionamentos monogâmicos foi e é muitas vezes normalizada e até “permitida” somente a homens e uma relação aberta pode tanto legitimar esta violência de gênero quanto trazer mais igualdade. Nesse aspecto algumas mulheres comentaram sobre a experiência da relação aberta ser uma grande falácia onde autoriza o homem a continuar seus hábitos poligâmicos sem respeito e nem diálogo.

 

Refletimos sobre como são desenvolvidas relações, sejam elas monogâmicas ou não e entendemos que a base para relações saudáveis é a boa comunicação entre as/os envolvidas/os. Entretanto, na nossa sociedade, o machismo e diferentes criações de gênero impactam também o modo como as pessoas se comunicam. Enquanto homens são distanciados de demonstrar sentimentos, fraquezas e frustrações, mulheres se utilizam de amizades, coletivos e rodas de conversas para debater e aprofundar incômodos. Isso, por sua vez, também sobrecarrega mulheres, que tentam entender a si próprias, a relação, aos outros, além de conciliar conflitos, enquanto homens foram distanciados dessas ferramentas de diálogo. Como falar de sentimentos com quem não quer tratar do assunto ou não consegue fazê-lo? 

 

Existe também a questão da divisão de tarefas e cuidados com familiares. Os trabalhos vinculados ao cuidado na maioria das vezes são realizados por mulheres e, nesse contexto, em um relacionamento o cuidado de crianças e familiares ainda sobrecarregam mais o gênero feminino. A partir deste recorte, a não-monogamia poderia auxiliar em uma melhor divisão de tarefas e cuidados entre os envolvidos, ou sobrecarregar mulheres, de modo que conciliar diversas relações a estas tarefas não se tornariam possíveis.

 

Algumas vivências compartilhadas

 

Ao compartilharmos nossas vivências, experiências somaram entre os relacionamentos que nasceram abertos, começaram a se abrir e tornaram-se não-mono, e os que se abriram e não se transformaram em nada melhor, nem muito diferente do que era na relação fechada. Algumas mulheres pontuam a opinião de que relações abertas são monogâmicas, outras por sua vez, consideram ser um primeiro passo para uma não-monogamia. Nossas vivências não são uniformes, mas entendemos que não faz sentido chamar “pegação” de relação não-mono. A pegação pode existir dentro de uma relação não-mono ou não, mas são duas coisas diferentes e se ela acontecer é ideal que seja realizada com respeito entre as partes envolvidas e muita conversa.

 

Segundo uma psicóloga do grupo, muitas/es/os pacientes jovens vem com a questão não-mono para o seu consultório. Mas ela se pergunta que relações esta geração tem buscado. Eles/as têm a impressão de estar escolhendo tudo e não perdendo nenhuma oportunidade da vida, entretanto toda escolha envolve um desejo, um caminho para conquista, alguma renúncia e muita responsabilidade. Será que elas/es têm consciência de que não escolher é também uma escolha e que ter relações não-monogâmicas também requer muitas renúncias? O hedonismo da sociedade atual e uma valorização de liberdades individuais faz com que jovens adotem relações não-monogâmicas na tentativa de fuga das escolhas. Entendemos que a dificuldade em se relacionar e o foco individualista podem levar à escolha de formatos não-monogâmicos sem uma reflexão mais profunda do que este modo complexo possa significar. 

 

Pensando em relações não-monogâmicas saudáveis nos questionamos também: Como é administrar o dia-a-dia destas relações não-monogâmicas? Mulheres contaram que é muito importante ter diálogo e estabelecer e falar sobre os combinados relacionais o tempo todo. Também disseram que ter ciúmes e sentir solidão acontece e não tem nada de errado com isso, faz parte da vida de qualquer pessoa que se relacione de forma não-mono ou mono ficar carente, sentir raiva, ciúmes, carência ou solidão.

 

Qualquer relacionamento profundo é um trabalho difícil, sendo mono ou não, envolvendo sexo ou não. Amar é uma das tarefas e habilidades mais complexas que as pessoas humanas podem desenvolver e não existe fórmula pronta, ou jeito certo de amar ou de se relacionar. Como seres gregários necessitamos viver com outras pessoas em interdependência, e por vezes nos apaixonamos e amamos muitas/es/os daquelas/es que transcorrem nossas jornadas. Como fazer com que estas relações se organizem de forma mais horizontal e menos hierárquica?

 

__________________________________________

         Se você leu o texto até aqui, obrigada! Nós (Iris e Rafaela) tentamos transcrever parte do que foi abordado nesta roda de conversa e te convidamos a colocar aqui nos comentários outras opiniões e vivências, além de participar conosco das próximas rodas :)

2024 rodas.jpg

1ª Roda de Conversa sobre a Não-Monogamia

 

A Quem Serve a Monogamia e a Não-monogamia?

Um Recorte de Gênero das Relações

Por iris De franco e Rafaela Lopes

bottom of page